domingo, 9 de maio de 2010

Cozinha "contemporânea"?

"Contemporâneo", segundo o Michaelis, é o que é do mesmo tempo, ou o que é do tempo atual. E "cozinha contemporânea", o que significa? Talvez o que não seja "contemporâneo" seja comida velha? Existe comida velha, no sentido de ultrapassada?

É claro que inovações são necessárias e muito bem-vindas. Só que precisamos separar o joio do trigo, ou melhor, o gostoso do nem tanto, a invenção da invencionice.

Já comi sushi de vatapá de frango aqui em Fortaleza, uma experiência que não recomendo - e que poderia bem chegar ao fim da vida sem ter tido (isso não entraria em nenhuma lista de cem comidas que você tem que comer antes de morrer).

Por outro lado, hoje existe a pizza de calabresa, ricota e manjericão; o sushi de robalo com uma fatia transparente de limão; o camarão no abacaxi; o frango com molho de ameixa...

Voltemos à cozinha contemporânea. O guia de restaurantes da Veja Fortaleza 2010 classifica os restaurantes como: Brasileiro/regional, Carne, Italiano, Peixes e frutos do mar, Bom e barato, entre outros. Nesses "outros", há a "Cozinha contemporânea". O que seria isso? Talvez comida transgênica? Essa é contemporânea com certeza... Será que um restaurante que serve pizza congelada, sopa Campbell's e soja transgênica (anunciada com orgulho) pode ser considerado contemporâneo?

Dos 16 restaurantes da categoria, eu e minha mulher já fomos em quatro. Num deles, a comida estava insatisfatória (filé mignon DURO!); em dois deles, regular (um abaixo da expectativa e outro com comida que parecia de fast food); num último, excelente (cozinha tradicional francesa e italiana). Como entender a categoria com base em nossa experiência?

Minha primeira impressão foi de que servia pra encaixar os restaurantes que não se enquadravam em nenhuma outra, talvez os que não fazem bem comida Brasileira/regional, Carne, Italiana, Peixes e frutos do mar, e que não são Bons e baratos? Uma olhada pelos restaurantes e pratos sugeridos pela Veja, além do que vimos nos cardápios, indica algumas tendências, não todas elas juntas:
  • Restaurantes variados, incluindo carnes, peixes, frutos do mar, massas, etc., em geral servindo pratos tradicionais ou com sutis inovações. Esses me parecem os mais respeitáveis desse grupo.
  • Misturas insólitas (picanha com gengibre, acredite!), misturas de ingredientes da moda (salmão com cream cheese) ou locais (castanha de caju), muitos pratos comuns mas com molho doce (mel, açúcar mascavo e rapadura estão presentes). Eu tenho um certo cuidado com esses, porque em geral o resultado me parece cair no lado ruim do "diferente".
  • Cozinha oriental, em geral chinesa, tailandesa ou japonesa, adicionando ingredientes locais. Aparecem em vários dos variados e insólitos, mostrando o gosto do consumidor.
  • Cozinha tradicional francesa ou italiana, mas com decoração moderna. Isso pode ser entendido, na Veja, nos restaurantes em que há mais linhas escritas sobre o ambiente que sobre a comida.
Desconheço o motivo para classificar vários dos restaurantes que se encaixam nos dois últimos pontos acima como Contemporâneos e não Orientais, Italianos ou Franceses. Aparentemente, o nome Cozinha Contemporânea deve atrair gente, independentemente do que se come lá.

Parece que também não há muito consenso entre os críticos de restaurantes sobre o que um restaurante contemporâneo deve ser, porque os votos foram dispersos. Apenas um restaurante recebeu dois votos; todos os outros votados receberam um só cada; o grande vencedor conquistou o estômago de somente dois dos jurados. (Já fomos nesse restaurante; é o que nos pareceu fast food...)

Em suma, "cozinha contemporânea" não parece ter um significado claro para restaurantes e clientes; desconfio que é usada como sinônimo de fazer diferente (ou tentar). Talvez o tempo dê seu veredito; talvez a cozinha contemporânea deixe um ou dois pratos bons que serão os tradicionais do futuro. Até lá, ficaremos sem ter um nome para o que comemos hoje.

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